O menino, o cortinado e o lobisomem.

Tinha acabado de chegar da cidade. Sua casa era mais afastada, dentro de uma floresta escura, pelo menos assim ele via. A casa era grande, 3 salas, 7 quartos, duas cozinhas. Morava só ele e a mãe, uma casa imensa para os dois. Cada um tinha seu espaço, mas ele tinha só 8 anos.

Sempre gostou da floresta, pelo menos das anteriores. Dessa tinha medo. Essa era escura, fechada e tinha um ser que o aterrorizava. Sempre acreditou em bobagens. Hoje acreditava no lobisomem. Sabia que era impossível mas, na cama, tentava se proteger embaixo das cobertas, utilizando aquele fino tear como escudo. Havia um “cortinado” que acreditava ser impenetrável, não apenas por pernilongos e besouros, mas que jamais o tal ser ultrapassaria aquele véu. Mas ainda assim tinha medo. Cada rastejo que escutava do lado de fora da janela era um aperto que se dava, se encolhia como se ele mesmo fosse se proteger, se abraçava.

Mesmo na impenetrável fortaleza de lençóis e véus, tinha medo de abrir os olhos, pois achava que se abrisse a fera estaria o encarando. Tinha medo que isso fosse verdade, por isso tentava dormir pra esquecer, mas era só mais uma noite de muitas outras.

Nem sempre haviam lobisomens, algumas vezes cobras rastejavam em seu quarto e subiam no seu véu. Outras vezes, tinha certeza de ter ouvido o bando de ladrões estranguladores bêbados do lado de fora de sua janela cochichando e maquinando planos para matar ele e sua mãe. Foram todas noites ruins, mas que acreditava avidamente que aqueles panos poderiam salvá-los. Tinha medo que mãe, longe no outro quarto, não tivesse a mesma esperteza e caísse nos planos do bando, ou do lobisomem, ou das cobras e ele nada pudesse fazer.

O menino cresceu. Nunca viu o lobisomem. Nem o bando. Viu cobras, até gosta delas, mas sem dor. Teve outros medos, sonhos que o aterrorizaram na grande cidade, medo de cair, medo de estar no alto, medo de ter que lutar contra tudo e não ter mais seu cortinado para proteger. Hoje ele está bem acompanhado, há uma moça. Agora ele tem medo de que aconteça algo a ela, então continua sua vigília, deixando-a protegida sob os lençóis e lutando com seus medos pra que eles não cheguem nela.

Hoje o menino ainda é menino.